CARTA-ABERTA

  Amazonas: sozinha contra o choque

 
"São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.”

 

Constituição de 1988, da República Federativa do Brasil, art. 231, caput.
 
 


Se a imagem é emblemática, a frase do capitão da Polícia Militar o é mais ainda: “Não posso garantir que quem usa cocar na cabeça e se pinta de índio seja realmente indígena” – e quem o pode?

O jornal O Estado de São Paulo trouxe estampada na capa a foto do despejo de 200 sateré-mawé, com a manchete “PM retira índios sem-teto de área invadida em Manaus”. Chamados de invasores, a etnia teve sua identidade indígena questionada e seu clamor por reconhecimento das terras ancestrais desacreditado.

Seria desnecessário enfatizar a distância entre os ditames estabelecidos por nossa Lei Maior e a atuação prática do Estado. Seria desnecessário denunciar a Polícia Militar utilizada na defesa de um dito direito particular de propriedade oposto aos direitos de uma gente, de uma aldeia, de uma nação, em operação baseada em liminar da Justiça Estadual – flagrante ilegalidade, quem se importa?

Não a mídia. Não a Justiça Estadual: a ilegalidade não é caso isolado, temos 76 assassinatos de indígenas registrados em 2007, sendo 48 apenas no estado do Mato Grosso do Sul, onde a resistência da etnia Guarani Kaiowá pela retomada das terras ancestrais passou pela pena de mais de 300 suicídios coletivos.

Então nós nos reunimos no Terra Tomada para nos perguntar quem são, de fato, os invasores. Nós nos reunimos no Terra Tomada sob a lição dos irmãos Villas-Boas, para entender que “os civilizados são uma sociedade sofrida”, porque vemos no trato das sociedades indígenas a necessidade de questionar a soberba presunção do Estado de Direito, da Lei.

É que entendemos a Lei não só como instrumento, mas como a representação de uma sociedade em um mundo que precisa ser reinventado. E nós nos reunimos no Terra Tomada para encontrar, atuando junto às comunidades indígenas, uma forma de reinventá-lo no Direito.

TERRA TOMADA
Grupo de Estudos de Direito Indigenista
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